Tramitam perante o STF dois recursos nos quais a responsabilidade dos provedores de internet, websites e gestores de redes sociais em relação ao conteúdo postado por terceiros é objeto de discussão – o Recurso Extraordinário 1.037.396, relativo à constitucionalidade do art. 19 da Lei 12.965/2014 (“Marco Civil da Internet”) e o RE 1.057.258 que se refere ao dever de as empresas hospedeiras de site na Internet fiscalizarem o conteúdo publicado e de retirá-lo do ar quando considerado ofensivo, sem intervenção do Judiciário.
Nesse sentido, Ministros do Supremo Tribunal Federal voltaram a defender a regulação das redes sociais em audiência pública convocada e realizada nos dias 28 e 29 de março p.p, no âmbito dos Recursos acima referidos.
Importante esclarecer que a criação da referida lei teve como objetivo central estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres a serem observados por provedores e usuários dos serviços de internet.
Contudo, a constitucionalidade do art. 19 do Marco Civil da Internet tem sido assunto amplamente discutido no meio jurídico. Isso porque, de acordo com a sua atual redação, as plataformas não podem ser responsabilizadas por conteúdos publicados por terceiros em suas redes, exceto em razão do descumprimento de uma ordem judicial anterior e específica que determine a exclusão do conteúdo.
E é aí que reside a discussão.
Quem defende a constitucionalidade do art. 19 do Marco Civil baseia-se, principalmente no direito constitucional da liberdade de expressão, uma vez que a “palavra final” cabe ao Judiciário, o que impede a censura privada por parte das plataformas.
A contrario sensu, a defesa da inconstitucionalidade e inadequação do artigo é pautada no suposto conflito da previsão legal com os ditames do direito do consumidor e direito civil, especialmente no que toca à reparação de danos, já que, sob esse prisma, plataformas digitais não demandariam esforços para coibir conteúdos inadequados veiculados nas redes.
A discussão também foi suscitada pelo Poder Executivo e, em 12 de abril p.p, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) publicou a Portaria 351/2023 que dispõe sobre medidas administrativas a serem adotadas para fins de prevenção à disseminação de conteúdos flagrantemente ilícitos, prejudiciais ou danosos por plataformas das redes sociais.
Referida Portaria menciona a importância da fiscalização dos conteúdos ilegais, nocivos e danosos nas plataformas de redes sociais referentes a extremismo violento que incentivam ataques a ambiente escolar ou fazem apologia e incitação a esses crimes ou a seus perpetradores, asseverando a necessidade do papel regulatório ativo dessas plataformas, em consonância com a tese americana mais recente no sentido de que, ainda que não sejam criadores de tais conteúdos, são responsáveis pela entrega desses conteúdos aos seus usuários por meio do gerenciamento personalizado dos algoritmos, contribuindo ativamente para a propagação célere de tais mensagens.
Assim, atentos a esse debate jurídico, pontuamos sobre a necessidade de promover uma internet mais segura no país, a fim de evitar a disseminação de conteúdos inapropriados, danosos e criminosos, como vem acontecendo reiteradamente, compatibilizando os limites de atuação dos gestores das ferramentas tecnológicas e o ordenamento jurídico brasileiro.
Flávia de Aguiar Pietri Vicente | flavia.vicente@nascimentomourao.adv.br
Sócia da área de Direito Consultivo Empresarial, Especialista em Direito Digital e Proteção de Dados.
Ramon Barbosa Tristão | ramon.barbosa@nascimentomourao.adv.br
Advogado da área de Direito Consultivo Empresarial.
Lúcia Guedes Garcia da Silveira | lucia@nascimentomourao.adv.br
Sócia Sênior Coordenadora do Consultivo Empresarial, Membro do Comitê de Diversidade e Inclusão e Especialista em Contratos.
Este texto é meramente informativo e não configura orientação jurídica a uma situação concreta, que deve ser individualmente avaliada. |