A teoria da dupla imputação é o conceito que exige que a responsabilização penal ambiental da pessoa jurídica deve ser, necessariamente, acompanhada da responsabilização de uma pessoa natural representante da empresa.
Essa polêmica teoria vigorou majoritariamente em nossos tribunais até o início da década passada quando, em 2013, o Supremo Tribunal Federal, em julgado paradigma, a afastou. Segundo o STF, o art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa, não podendo o interprete adicionar essa condição por meio da aplicação da referida teoria.
Além disso, segundo nosso tribunal máximo, a identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da produção do fato ilícito não se confunde com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual.
Pois bem, concordando ou discordando do STF os tribunais o seguiram. Uma rápida análise da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, demonstra que, em 2021, 06 (seis) decisões trataram do tema e nenhum aplicou a teoria da dupla imputação.
Ocorre que ao apagar das luzes dos dias úteis do judiciário em 2021, o TFR-3 publicou um julgado que parece divergir desse entendimento. Trata-se do MS Criminal 5008866-57.2018.4.03.0000, de relatoria do Desembargador Federal Maurício Kato, no qual o tribunal findou aplicando a teoria da dupla imputação. Lê-se no acórdão, que foi claro ao se posicionar:
Conquanto a 1ª Turma do C. STF, por maioria, tenha afastado a teoria da dupla imputação no julgamento do RE nº 548.181/PR, em que admitiu a possibilidade de a pessoa jurídica figurar de forma isolada no polo passivo de ações penais, adoto entendimento diverso.
Registro que a meu ver, o artigo 3º da Lei n° 9.605/98, ao disciplinar o dispositivo constitucional prevê a hipótese de coautoria necessária, ou seja, não dissocia a responsabilidade da pessoa jurídica da decisão de seu representante legal, contratual ou colegiado, no interesse da sociedade, in verbis:
Art. 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Entendemos que o posicionamento do TRF-3 neste julgado é sintomático para evidenciar que não é pacífica a posição adotada pelo STF sobre a prescindibilidade da imputação concomitante de pessoas física e jurídica nos crimes ambientais. Ainda é cedo para dizermos que há uma tendência de retomada da teoria da dupla imputação, mas é certo que decisões como a analisada e outras que vem ocorrendo de forma esparsa nos tribunais pátrios poderão reacender a discussão deste tema.
João Emmanuel Cordeiro Lima | joaoemmanuel@sail.joaovictor.tech
Sócio Senior da área de Direito Ambiental e Regulatório. Reconhecido na área pelo renomado guia internacional Who’s Who Legal.
Pedro Henrique Montanher | pedro.montanher@sail.joaovictor.tech
Sócio da área de Direito Penal Ambiental e Consultivo.
Este texto é meramente informativo e não configura orientação jurídica a uma situação concreta, que deve ser individualmente avaliada. |