Caso Dora Figueiredo: Não comenta o mesmo erro da influenciadora, que reformou o imóvel alugado
Especialistas explicam os erros da influenciadora e as regras para reformas em imóveis alugados
“A internet vende uma coisa que não é real”, disse a influenciadora Dora Figueiredo em uma série de vídeos em que conta seus percalços com uma reforma em um imóvel que alugava, feita parcialmente através de uma permuta. Como ela mesma relata ao longo das gravações, o drama do apartamento da Dora Figueiredo ensina lições valiosas a quem aluga ou pretende alugar um imóvel no futuro.
Para quem está por fora da mais recente polêmica das redes sociais, resumimos a história relatada por Dora em seus vídeos. A influenciadora afirma que alugou um imóvel e decidiu reformá-lo para se tornar um “apartamento de revista”. Ela conta ter proposto para a proprietária uma futura compra do apartamento, em uma conversa por e-mail que não foi formalizada em contrato.
Quando chegou o momento em que Dora Figueiredo procurou a proprietária para propor a compra do imóvel disse ter ouvido um pedido de valor maior do que esperado inicialmente. Sem dinheiro para adquirir o imóvel pelo novo preço, desistiu do negócio e devolveu o imóvel. Ela relatou seus dramas após questionamentos de seus seguidores, que repararam o sumiço do apartamento tão celebrado por Dora.
O que Dora Figueiredo fez de errado no aluguel?
Dora Figueiredo não divulgou nem o contrato de aluguel em si nem a troca de e-mails com a dona do imóvel. No entanto, especialistas ouvidas pela Inteligência Financeira ponderam que qualquer acordo entre as partes precisa estar devidamente documentado.
Portanto, se Dora tinha a intenção de comprar o imóvel ao final da reforma e aluguel, isso deveria estar acertado entre as partes e documentado. Da mesma forma, custos e eventuais indenizações com as benfeitorias que ela desejava realizar no apartamento precisavam ter sido combinados formalmente.
“A lei prevê como devem funcionar as benfeitorias, mas em contratos de locação vale muito o que as partes combinam”, explica Maria Victoria Costa, especializada em direito imobiliário e sócia do escritório MV Costa Advogados.
A forma mais tradicional, é claro, é a formalização em contrato, no momento do aluguel ou depois. No entanto, mesmo o e-mail pode ser uma evidência, desde que seja autêntico e contenha expressamente o acordo, com os detalhes necessários.
“A Teoria de Contratos avançou bastante no ordenamento jurídico brasileiro, de forma que propostas ainda que não formalizadas através de minutas assinadas são sim consideradas como manifestação de vontade”, explica Flávia Pietri, sócia do Nascimento e Mourão Advogados e especializada em direito digital. A especialista pondera, no entanto, que o uso de e-mails demanda a possibilidade de verificar a autenticidade das mensagens.
Como funciona a opção de compra
A Lei nº 8.245, de 1991, conhecida como Lei do Inquilinato ou Lei da Locação, estabelece que o locatário tem a preferência para a compra do imóvel em igualdade de condições com terceiros.
Maria Victoria Costa afirma que Dora poderia ter assinado um instrumento conhecido como opção de compra. É um documento em que locador e locatário oficializam a intenção de compra e venda, eventualmente definindo um valor e um prazo para negociar o imóvel.
A advogada explica que embora não seja muito comum, o instrumento serve para casos como o de Dora, em que há o desejo ou a necessidade de melhorias de longo prazo mas o locador não dispõe do dinheiro para comprar o imóvel imediatamente. As regras para a opção de compra também podem constar diretamente em contrato.
As regras para benfeitorias no imóvel
A Lei do Inquilinato dá as regras gerais para benfeitorias feitas no imóvel durante o período de aluguel. Essencialmente, a lei estabelece que há três tipos de benfeitorias:
- Benfeitorias necessárias: São aquelas adaptações indispensáveis para a habitação do inquilino. A lei não especifica em minúcias, mas segundo Maria Victoria, trata-se, por exemplo, de um vazamento que precisa de reforma. A lei diz que essas benfeitorias não dependem de autorização do locador e são indenizáveis.
- Benfeitorias úteis: São aquelas que são necessárias para a habitação, ainda que não urgentes. Por exemplo, a compra de um armário. Nesse caso, a benfeitoria só será indenizável se previamente autorizada.
- Benfeitorias voluptuárias: São as benfeitorias feitas apenas por um desejo do locatário de melhora da qualidade de vida. No entanto, não são indenizáveis. Por outro lado, o locatário pode desfaze-las, desde que isso não altere a estrutura do imóvel.
“O projeto arquitetônico mencionado pela influenciadora, inclusive a instalação de jacuzzi apontam para caracterização de benfeitorias voluptuárias”, explica Flávia Pietri. Por outro lado, mesmo que a lei coloque as bases gerais, Maria Victoria Costa pondera que “a diferença é muito tênue” entre quais benfeitorias são úteis ou voluptuárias, o que reforça a importância dos combinados entre as partes.
A instalação da jacuzzi por Dora Figueiredo
Um dos principais pontos dos vídeos de Dora Figueiredo, que ela diz que foi o seu “pesadelo”, foi a instalação de uma jacuzzi no imóvel. Ao usar uma vez a banheira, a influenciadora conta ter recebido uma notificação do prédio de que isso era proibido.
Nesse ponto, a briga de Dora Figueiredo é com o Doma Arquitetura, o escritório responsável pela obra no imóvel. A influenciadora lamenta não ter sido avisada de que precisaria de uma autorização para poder ter a jacuzzi.
De acordo com Flávia Pietri, ela de fato precisava de autorização para a instalação da banheira. “Desde 2014, a regra prevista na ABNT 16.280 traz uma série de requisitos para aprovação de reformas, também pelo condomínio, uma vez que reformas das unidades podem interferir no todo condominial, com impacto à sua parte estrutural, hidráulica e elétrica, o que parece ter ocorrido no caso”, afirma a advogada.
Em vídeo, a arquiteta Patrícia Pomerantzeff, do Doma, enalteceu a sua trajetória profissional, afirmou que “toda história tem dois lados” e disse que “tem clientes que vivem uma adolescência tardia”. “Dê tempo ao tempo, esfria a cabeça, ninguém é obrigado a continuar com você, é só deixar o cliente livre para seguir com outro profissional”, aconselhou.