STJ e a inédita decisão sobre a pessoalidade da responsabilidade penal de empresa incorporada.
No último dia 20 de setembro de 2022 foi publicado o acórdão do Recurso Especial nº 1.977.172/PR. A decisão abordou o inédito tema, aos menos nos tribunais superiores, da transcendência da responsabilidade penal da pessoa jurídica objeto de incorporação.
No caso objeto do recurso em comento, a Agrícola Jandelle S.A., em 2008, passou a ser investigada como autora da prática do crime de poluição (previsto no artigo 54, § 2º, V, da Lei nº 9.605/1998). Em 2014, a averiguada foi incorporada pela Seara Alimentos Ltda. A denúncia foi oferecida em 2018.
Em sede de defesa, a incorporadora alegou sua ilegitimidade, a qual não reconhecida e ensejou a impetração de mandado de segurança (MS). O MS foi julgado pelo Tribunal de Justiça do Paraná em favor do reconhecimento da cessação da responsabilidade penal da Jandelle quando de sua incorporação e consequente extinção. O Ministério Público paranaense, então, interpôs o Recurso Especial em referência.
O relator do recurso, Ministro Ribeiro Dantas, pontuou que se o direito pátrio reconhece a imputabilidade da pessoa jurídica, deve também lhe estender as benesses das pessoas físicas, ou seja, em havendo sua extinção, exceto se fraudulenta, esta equivale à morte da pessoa natural e impede que sua condenação se transmita para seus sucessores. Acompanharam o voto do relator outros três ministros da Terceira Seção do STJ.
De outro lado, Joel Ilan Paciornik e Rogerio Schietti Cruz entendem que a incorporação de uma pessoa jurídica é programada e volitiva. A incorporadora teve a chance de deliberar sobre os ônus da incorporada e assumiu as consequências deste ato, planejado e intencional. Seguiram a divergência outros dois ministros, ficando a votação empatada em 4 a 4.
Coube, então, ao presidente da Terceira Seção, Reynaldo Soares da Fonseca, o voto de desempate. E este foi assertivo no sentido de que “na medida em que a sociedade deixe de existir, a situação se denota análoga à morte da pessoa física, e, portanto, a pena aplicada ou a ser aplicada não poderá ser transmitida à sociedade superveniente”.
A divergência constatada nas manifestações dos ministros da corte da cidadania, sinaliza que a questão não está nem perto de ser pacífica.
Poderá haver recurso ao STF para dirimir eventual questão de ordem constitucional, o que ainda não foi feito. De toda forma, a decisão é retumbante e já poderá influenciar julgamentos diversos, embora não seja um precedente vinculante.
Pedro Henrique Montanher | pedro.montanher@
Sócio da área de Direito Penal Ambiental e Consultiva.